sexta-feira, 16 de setembro de 2016

ANSIEDADE

            
Desiludido e pobre, como sempre, caminhando com sapatos e calças furadas, como sempre, buscando um sonho impossível, algo inimaginável, inalcançável. Uma piada pronta em cima de uma árvore gigante. O sol está quente hoje, o sol estará quente amanhã. Com suas oito horas luz de distância, fritando meus miolos em uma caminhada de no mínimo quarenta minutos pelo inferno do asfalto quente, como sempre, sou eu quem se fode.
            Mas estou escutando Rolling Stones.
            Dane-se Mick Jagger. Estou caminhando no sol enquanto ele tem milhares de anos e garotas. Tem milhares de dólares na conta e muitas histórias para contar. Eu permaneço enriquecendo minhas mentiras, histórias que gostaria de ter vivido, páginas pútridas de histórias distopes.
            Ainda morrerei de ansiedade.
            Eu, pobre diabo, como sempre, ando com sapatos e calças furadas. Hoje minha crise de ansiedade estragou meu dia.
            Claro que prefiro um homem vivo a um deus grego morto. Claro que Hélios resolveu me sacanear e jogar na minha cabeça o sol mais quente dos últimos anos. O asfalto fervilhava, e o céu distorcia em um azul claro e maligno. Minha falta de ar que me acompanha nos últimos anos meu deixou mais lento, mais cansado, mais estático.
            Carros bonitos com seus dignos motoristas.
            Pessoas tomando refrigerante na calçada. Eu gostaria muito de comprar um salgado tímido, perdido em alguma venda, mas tenho alguns centavos na carteira, sapatos e calças furadas.
            E se pudesse misturar tudo em uma sopa espessa de desgraças, de coisas que não deram certo. Ainda poderia assim, com alguns versos sem rima, sem gosto, sem pudor. Claro que tudo não passa de ódio contido, sou o rei do ódio contido. O eterno idiota que dirá os comentários mais sarcásticos e inúteis que vocês conhecem.
            Estou falando sozinho de novo.
            Estou falando diante do espelho.
            Estou ignorando boas ações, como sempre.
            Uma angústia toma conta do meu peito as nove horas da manhã. Tenho prazos, tenho números, tenho contas para bater, tenho uma meta para atingir, tenho obrigações, tenho que alimentar o sonho como se fosse um fogo rebelde que teima em queimar minha própria casa, tenho milhões de planetas para visitar, porém, me falta oxigênio. Fico ansioso, perco minha mente e meu ar, tudo se torna mais escuro, mais sombrio, mais sem sentido. Ainda irão chamar meu nome e dar o triste aviso que fui o indicado pelos meus próprios erros.
            Na minha bolsa, livros.
            Na minha mente, ideias
            Nos meus sonhos, pesadelos.
            Na minha alimentação, veneno.
            Nos meus sapatos, furos.
            Idem, minhas calças.
            Nem os pobres diabos aguentam o sol escaldante. Nem os mais putos da vida aguentam o sol da tarde sobre as cabeças, gritando como um louco da cidade.
            A velha coceira me ataca em público.
            Gostaria de ter vício dos quais nunca tive.
            Uma pequena dor de cabeça que nunca sai da minha fronte direita. Minha eterna vontade que as pessoas que não gosto morram de maneira imbecil. Ah, Darwin, que ideia idiota de evolução. Pena que ela está tão correta.
            Que ideia idiota de calendário.
            Que ideia idiota de horas.
            Mas o tempo está acabando, não sei se devo contar crescente ou decrescivamente. Não sei se tudo não passa de uma bomba relógio. Da hora de se jogar do quarto andar e ver os pássaros voarem de cima para baixo.
            Mas o tempo é cruel, junto ao sol, junto aos prazos, junto às dores, junto ao cansaço, junto às noites onde não se sonha.
            Tudo é tão escuro como a mais triste noite. Não importa qual música o seu celular escolha para tocar.
            Nem mil Chaplins o animam.
            Nem mil Chapolins te fazem rir.
            Nem mil Shakespeares te fazem sonhar.
            Porém uma única preocupação e tudo vem abaixo. Porém um ponto negativo, uma cara fechada, uma pergunta mais incisiva e tudo desmorona.
            Um brinde a sua falsa autoestima.
            Lástima.
            Calças e sapatos furados, como sempre.
            Uma calçada de paralelepípedos que machucam os pés. Esta é a vida.
            A vida.
            Ansiedade, sapatos e calças furadas, como sempre.

            

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