A apresentação deste escritor será feita de uma maneira péssima. Seria muito
curioso escrever um texto apresentando a mim mesmo na terceira pessoa. Talvez
seja até uma espécie de egocentrismo mascarado, ou alguma loucura escondida que
logo virá a tona e me tornará o monstro conhecido por todos e por ninguém.
Obviamente este escritor, que anda com tantas mil malucas ideias na cabeça,
pode ao certo escrever sobre milhares de coisas e esta é a ideia deste lugar.
Mas
isto não vem ao caso.
O
escritor que está digitando este texto no seu computador velho, no seu quarto
pequeno, nesta noite quente está aproveitando para por as ideias em dia. Ouve
uma música feita de batidas instrumentais, algo um pouco com uma “vibe” de tomar um ônibus na madrugada e
ver até onde ele pode parar. Saber que seria impossível não imaginar tais
coisas em um lugar tão pequeno, fazendo ruídos irritantes com as duras teclas
do teclado.
O
mundo moderno é uma maravilha, num exercício de pura atenção, o escritor está
mudando o foco do texto para uma conversa em uma rede social, para voltar ao
texto. Vivemos num mundo conectado e estas conjecturas são possíveis na medida
do possível.
Claro
que este pequeno texto não terá nada demais, é apenas uma apresentação. Ele falhará
miseravelmente como apresentação, mostrando a ineficácia do autor em uma autodescrição
fiel e sem floreios. O mesmo olhará no espelho as duas da madrugada buscando
algumas marcas da velhice. Tem vinte cinco anos e sente-se como se tivesse
duzentos. A calvície já ataca e o estomago já não age de maneira normal.
Mas
isto também não vem ao caso.
Quase meia noite.
O silêncio da rua pode traduzir em um
profundo mistério plano, pairando sobre as nobres cabeças dos que dormem de
noite e trabalham no dia seguinte. Falarei mais do meu trabalho em outra
oportunidade, pois agora descrevo este, o meu de escritor.
Escritor
amador! – gritam no meu interior.
O
editor de textos, meu fiel amigo, grifa em rubro minhas deficiências gramaticais.
Este é apenas um texto inaugural, não tem uma ideia fixa ou um causo que, você
leitor, vai gostar de ler. Alias, eu diria que você poderia se sentir em casa,
mas que não deveria reparar na bagunça, pois ainda está em reforma.
Tenho
uma teoria sobre castelos, mas deixo isso para outro momento.
O editor de textos me sugere maneiras
melhores de escrever e compor um texto. Fazê-lo de maneira arbitrária, ou ao
menos, acatar sua ajuda e assim escrever algo com uma clareza maior acaba sendo
mais fácil. Troco “s” por “z” e ele corrige automaticamente. Santa tecnologia.
Mas
isso não vem ao caso.
O
escritor termina seu texto. Ele fará como crianças sempre o fazem: um desenho
completamente sem sentido que mostrará
para toda a família e receberá afagos na cabeça. “Que bonito!” Eles dizem sem
ao menos entender o que é.
No fundo,
o autor não sabe o sentido.
No fundo,
o escritor sabe que não faz sentido.
Mas
o texto está lá, e não vem ao caso.
O
escritor também está. Respirando e digitando. As ideias estão em dia. E tudo
faz muito sentido, ou é realmente muito claro. E a batida no ouvido continua. Aquela
vontade louca de sair em meio a chuva da madrugada, sentir a água no corpo,
sentir-se pleno.
Eu deveria estudar crase.
Isso não vem ao caso.
Então,
caro leitor, sinta-se em casa. Não repare a bagunça, não repare a loucura, não
repare a falta de convicção, não repare a má gramática, não repare as ideias
roubadas, não repare os cadáveres, não repare a podridão, não repare os versos
feridos, não repare as dores do passado, não repare os dias de fúria, não repare
o dente quebrado.
Sinta-se
em casa.
Do seu amigo, Míope Psicopata.
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